(Fonte da imagem: Reprodução/CERN)
Nos últimos dias (como noticiamos aqui), muitos comentários surgiram a respeito das “Partículas de Deus”. Os bosóns de Higgs (nome real do elemento) são hipotéticos, mas os cientistas do CERN (Organização Europeia de Pesquisas Nucleares) estão muito próximos de conseguir provar sua existência.
Caso consigam, estaremos um pouco mais próximos de explicar as origens do universo e de todos os materiais que existem nele. Teoricamente, os bósons de Higgs foram os primeiros elementos a apresentar massa e energia, o que significa que toda a matéria existente nos planetas e espaço surgiu de um único ponto.
O que falta para confirmar?
Na notícia passada, falamos que ainda não existia confirmação sobre a existência do Bóson, pois faltava uma série de testes a serem realizados. Agora, os dois grupos do CERN (Atlas e CMS) que pesquisam o elemento independentemente anunciam resultados similares.
Medindo a massa das partículas em gigaelétron-volt (GeV), os cientistas conseguem analisar tudo como se fosse energia. E é por essa unidade que os dois grupos estão entrando em congruência. O Atlas afirma que a Partícula de Deus deve estar entre 116 e 130 GeV. Já o CMS dá valores que vão de 115 a 127 GeV. Agora, os novos testes devem se limitar a essa faixa energética para tentar localizar o bóson de Higgs.
(Fonte da imagem: Reprodução/CERN)
Por que é tão importante?
Caso seja provada a existência dos bósons, uma série de explicações sobre a expansão do universo poderá ser melhor embasada. Isso também significa que teremos evidências irrefutáveis da explosão primordial (Big Bang), pondo fim a boa parte das hipóteses que tentam derrubar as teorias referentes a ela.
Mas se acontecer o contrário e for provado que os bósons de Higgs não existem, os cientistas terão um grande problema para resolver, conforme dito pela New Scientist. Tudo o que imaginamos sobre a expansão do universo com base em massa e energia precisará ser revisto. Ou seja, precisaremos de uma nova gama de teorias para tentar explicar a origem de tudo.
Nas horas que se seguiram ao anúncio da quase-descoberta do bóson de Higgs, a tão procurada partícula elementar necessária para completar a teoria da física que rege o mundo microscópico, ouvi cientistas reclamando da “intervenção divina” na cobertura do evento.
Muitos não gostam do apelido que a mídia adotou para deixar essa entidade corpuscular mais sexy: a “partícula de Deus”. Com razão, querem evitar que as pessoas pensem que a detecção do bóson de Higgs possa ser uma espécie de confirmação da existência do Todo Poderoso. Isso não faz o menor sentido, é claro, e por isso o nome preferido até agora é o oficial _uma referência a Peter Higgs, criador da teoria que descreve a partícula.
O que alguns cientistas não levam em conta é que esse apelido impopular não foi dado por nenhum jornalista impertinente, e sim por Leon Lederman, ganhador do prêmio Nobel de Física de 1988. Ele é autor de “The God Particle”, livro que explica a teoria para o público leigo.
A piada que Lederman usa para justificar o nome é a de que foi proibido por seus editores de intitular o livro “The Goddamn Particle” (A Maldita Partícula). Mas a verdadeira inspiração para o título, explica depois, está num exemplo que ele encontrou em “um livro bem mais antigo”: a Bíblia. E esse sacrilégio cometido pelo físico guarda uma analogia bem interessante.
O bóson de Higgs é um componente teórico fundamental para entender por que as partículas elementares conhecidas até agora tem massas tão diferentes umas das outras. Um elétron pesa até 200 mil vezes mais que um neutrino, e ninguém entende por quê. Essas partículas, porém devem interagir com o bóson de Higgs, que lhes confere a propriedade da massa. É possível então entender a partir dessa interação por que elétrons, neutrinos, quarks etc. são tão diferentes. Do contrário, seria preciso supor que a natureza conferiu propriedades aleatórias aos seus componentes mais fundamentais.
Como objetivo da ciência é construir uma descrição da realidade o mais compacta e coerente possível, não faz sentido imaginar que os componentes mais básicos da matéria e da energia sejam um zoológico de entidades totalmente diferentes umas das outras.
O Velho Testamento possui uma tentativa semelhante de explicar por que os povos falam tantas línguas diferentes e não entendem uns aos outros. Segundo uma passagem do Gênesis, quando os humanos eram um povo só com uma língua única, tentaram construir a Torre de Babel para atingir os céus e irritaram Deus com sua petulância. O que Ele fez então foi espalhar a humanidade pela Terra e fazer com que povos distintos falassem línguas diferentes. Dessa forma, não poderiam criar uma sociedade poderosa a ponto de se equipararem ao poder divino.
Se Deus foi usado como explicação para a humanidade ter línguas diferentes, diz Lederman, o bóson de Higgs seria a explicação para as partículas elementares terem massas diferentes.
Por alguma razão, em língua portuguesa convencionou-se traduzir o apelido do bóson como “partícula de Deus” e não “Partícula Deus”, que seria a forma correta. Meu colega jornalista de ciência Igor Zolnerkevic, físico que costuma ler nossas reportagens com olhos afiados, supõe que “seria uma imagem bizarra demais a de um Deus em forma de partícula subatômica; o velhinho de barba é muito mais simpático.”
Se a maioria dos cientistas não gosta de incluir Deus nessa história, Peter Higgs já disse que fica incomodado também de ver a partícula batizada apenas com seu nome. Para ele, é preciso fazer jus a outros físicos _François Englert e Robert Brout_ que também deram grandes contribuições à teoria. Me parece pouco prático batizar a partícula como “bóson de Englert-Brout-Higgs”, porém.
De todo modo, se os físicos decidirem dar outro nome à partícula, talvez devam esperar um pouco. Mesmo tendo conseguido ver sinais otimistas neste ano no acelerador de partículas LHC, uma confirmação da existência do bóson de Higgs só deve sair em meados do ano que vem, quando o experimento tiver acumulado mais dados. Se por algum azar a partícula continuar se escondendo, toda essa discussão bizantina terá sido sem sentido.
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